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O destino de Marta, a Senhora Espumante
Viver 3 20 min. 30.12.2021 Do nosso arquivo online
Entrevista

O destino de Marta, a Senhora Espumante

Aos 40 anos, Marta Lourenço é responsável por três milhões e meio de garrafas de espumante por ano.
Entrevista

O destino de Marta, a Senhora Espumante

Aos 40 anos, Marta Lourenço é responsável por três milhões e meio de garrafas de espumante por ano.
Foto: Rui Oliveira
Viver 3 20 min. 30.12.2021 Do nosso arquivo online
Entrevista

O destino de Marta, a Senhora Espumante

Aos 40 anos, Marta Lourenço é responsável por três milhões e meio de garrafas de espumante por ano. Na enologia das caves Raposeira e Murganheira, é ela quem mais ordena. Chegou como estagiária, num carro comprado com o dinheiro ganho na caixa de um supermercado. Antes, trabalhara a acartar lenha e a cozinhar num restaurante. Por entre alquimias de adega, apaixonou-se pelo filho do patrão. Agora, dá cartas no vinho que mais rima com glamour.

(Ana Sofia Fonseca)

Já tem o espumante escolhido para a passagem de ano?

Honestamente, não. Costumamos beber vários: dos nossos e de outras casas, sobretudo champanhes.

Esta é a época do ano em que mais se consome espumante. Os portugueses continuam a ver o espumante como uma bebida de brinde?

Tenho a certeza, os números atiram-nos isso à cara. Na Raposeira, vendemos 2,5 milhões de garrafas por ano, meio milhão ao longo do ano e dois milhões nesta altura. O consumidor da Murganheira é diferente. Compra mais ao longo do ano, sabe que o espumante é óptimo para acompanhar uma refeição. Nas festas, diferença é que procura uma embalagem com glamour para oferecer.

O Raposeira é o espumante do bolo de aniversário e das 12 passas na passagem de ano?

Posso parecer arrogante, mas em termos de relação qualidade/preço é o melhor espumante nacional. A forma como trabalhamos é igual à da Murganheira. Colocamos a um preço acessível porque o nosso objectivo é que toda a gente, na passagem de ano, possa abrir um bom espumante. Temos 12 milhões de garrafas em estágio, uma para cada português. É um espumante para os portugueses.

Em Portugal a atitude está a mudar e já há muita gente a acompanhar a refeição com espumante

Foto: Rui Oliveira

O espumante é visto de forma muito diferente noutras culturas. No Luxemburgo, na Bélgica, por exemplo, não é uma bebida só de festa.

Sim, é verdade. Mas em Portugal a atitude está a mudar e já há muita gente a acompanhar a refeição com espumante. O espumante tem muitas vantagens: é altamente diurético, nas dietas os médicos não costumam proibir. Eu cresci ligadaànatureza, sou capaz de passar meia hora a fotografar um bichinho qualquer. Quando assumi a enologia, tentei transmitir isso aos espumantes. Eu costumo dizer, às pessoas, que podem apanhar a maior borracheira do mundo com Murganheira que não têm ressaca.

Isso é a maior publicidade que pode fazer a um vinho.

Tenho várias pessoas que já mo confirmaram (risos). As dores de cabeça estão associadas aos produtos químicos e connosco a indústria química não se safa. Também tem a ver com más fermentações, claro.

A nossa produção segue 80% para o mercado nacional e 20% para exportação. Esses 20% estão no mundo inteiro

Foto: Rui Oliveira

Vende fora de Portugal?

A nossa produção segue 80% para o mercado nacional e 20% para exportação. Esses 20% estão no mundo inteiro.

Sobretudo no mercado da saudade?

Sim, maioritariamente. Onde há emigração portuguesa, estão lá os nossos meios secos eoreserva bruto. Nos países onde não há a nossa emigração, pedem mais os espumantes alta gama.

França é a terra do champanhe. É um destino impossível para o espumante nacional?

Olhe que vendemos lá! Mas deve ser para o mercado da saudade.

A voz brilha de alegria. O mesmo olhar traquina das fotos de infância. No dia da comunhão, junto ao altar, a receber a hóstia com aquele seu jeito de querer descobrir mundo. Vestidinho branco abaixo dos joelhos, soquetes com renda, vaidades compradas na feira de domingo ou mandadas fazer na costureira da terra. Nesse dia, bolo e espumante na mesa. Era sempre assim nos aniversários e na passagem de ano. Os pais trabalhavam de sol a sol para alimentar os três filhos, luxo era palavra desconhecida.

Foto: Rui Oliveira

É uma miúda do campo?

Cresci numa aldeia [Alqueve, município de Arganil] onde vivem 30 pessoas. Na segunda classe éramos quatro alunos: dois na segunda, um na terceira e outro na quarta. Vinha uma professora à aldeia dar-nos aulas. Outros tempos.

Estamos a falar dos anos 80. A professora ainda dava uso à régua?

Esta mão levou 50 reguadas!

50?! Como é que isso aconteceu?

Os meus pais são pessoas muito simples e tinham três filhos. Os professores percebiam que nós não tínhamos condições e deixavam-nos ficar na escola depois das aulas, a terminar os trabalhos, porque havia um fogãozito e, pelo menos, estávamos aquecidos. Quem ficava a tomar conta era a colega da quarta classe.

E o que é que aconteceu?

Lá me portei mal e levei as 50 reguadas. Se doeu!... Tenho uma fotografia com a professora, mas nem gosto de a ver... Outra vez, estava a aprender a tabuada, 6x4, nunca mais me esqueço. Eu era tão manhosa que dava a desculpa que não via para o quadro e olhe que o meu oftalmologista diz que eu vejo bem demais! Ela perguntou-me algumas três vezes quanto é que era, como não respondi, deu-me um bofetão que até me fez saltar da cadeira! Nunca mais me esqueci de quanto é 6x4...

Em casa, também apanhava?

Eu era um diabo! Até aos 17 anos apanhei todos os dias da minha mãe. Fosse com o cabo da vassoura, com a mão... Eu era um rapaz autêntico! Só estava bem em cima das árvores e a portar-me mal!

O que é que o seu pai fazia?

Ainda hoje, a vida dele é na lenha. Vende lenha.

E a sua mãe?

Até aos meus seis anos, estava em casa a tomar conta de nós. Depois, foi trabalhar para uma cerâmica. Como só tinha a terceira classe, teve de ir tirar a quarta classe à noite. Às vezes, ia com ela para a escola. Lembro-me bem de a ajudar a aprender um bocadito de inglês. Ela fez a quarta classe para ir para uma fábrica de móveis, tirar tábuas daqui e de acolá. Entretanto, teve um acidente de trabalho e reformou-se por invalidez.

Há alguma frase dos seus pais que não esqueça?

Os meus pais nunca nos impuseram nada, nunca tivemos horário para entrar em casa, nunca nos controlaram. Mas o meu pai sempre me disse: “Minha filha, bem fazes a cama, bem te deitas nela. Como a fizerdes, assim a acharás.” Com 16 anos, tinha dias de vir da discoteca às seis da manhã, mas já sabia que era trocar de roupa a correr e ir atrás dele trabalhar.

Ajudava muito?

Costumo dizer que comecei a trabalhar aos cinco anos, a vender sacos de pinha e caruma. Ajudávamos o meu pai a rachar lenha e assim. O pior trabalho que já fiz foi descascar eucaliptos. Nem imagina o que é em Agosto, no pico do calor, andar com uma machada a descascar eucaliptos... O eucalipto tem de ser descascado logo porque senão a casca agarra. Aquilo era horrível! Depois, com 16 anos, tornei-me independente. Comecei a fazer voluntariado e a trabalhar na restauração.

Onde é que fazia voluntariado?

Na APPACDM (Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental), em Arganil. Estive lá seis anos, o meu sonho era ser terapeuta ocupacional.

Eu sou o verdadeiro exemplo de que o destino está traçado. Estou convencida de que o meu destino estava traçado à nascença

Foto: Rui Oliveira

Como é que passa de terapeuta ocupacional a enóloga?

Eu sou o verdadeiro exemplo de que o destino está traçado. Estou convencida de que o meu destino estava traçado à nascença. Eu estudava, fazia voluntariado e trabalhava à noite.

Revê-se na imagem de self-madewoman?

É, tive uma vida assim puxada. A minha carta de condução fui que que paguei, nem um tostão pedi aos meus pais. A minha primeira mota, o meu primeiro carro...

As conquistas têm outro sabor.

Olhe que é mesmo verdade.

Como é que era o voluntariado?

Eu adorava, foi uma coisa que realmente me preencheu. Sentia-me tão amada por aqueles meninos... Comecei a fazer voluntariado nas férias de verão, acabei por ficar o ano inteiro. O meu trabalho era ajudar aquelas crianças a aprender a comer com talheres, a cortar um bife, a fazer uma cama... Um dia, numa colónia de férias, tive a certeza absoluta que aquele era o meu caminho. Estava com um menino, que ainda hoje lá está, que não fala, que não interage e eu comecei a brincar com ele, a passar o meu dedo com gelado nos lábios dele. Ele começou a comer e eu bati uma palma e ele bateu também, e eu bati duas palmas e ele fez o mesmo. De repente, a psicóloga chega, e nem quer acreditar! Aquilo mexeu comigo de uma maneira que eu decidi que queria ser terapeuta ocupacional.

Então, como é que vai parar a enologia?

Eu queria ir para terapia ocupacional em Alcoitão. Como era uma escola privada e os meus pais não tinham possibilidades, inscrevi-me e fui logo lá à procura de trabalho. Arranjei emprego no Continente. Mas não entrei por três décimas. No ano seguinte, voltei a concorrer e não entrei por uma décima. Eu só queria aquele curso, não concorria para mais nada. No terceiro ano, resolvi candidatar-me para Alcoitão e para tudo o que tivesse a ver com natureza. Volto a não entrar em Alcoitão por uma décima, mas entro na Escola Superior Agrária de Santarém, que era a minha sétima opção.

E foi aí que veio a paixão pela enologia?

Não! Eu meti na cabeça que queria seguir hortofruticultura. A professora de enologia, que era onde eu tinha piores notas, um dia, diz-me que vou estagiar na adega de um amigo dela. Disse-lhe que não gostava de vinhos, mas ela lá me convenceu a ir fazer a vindima. Como a vindima era remunerada, lá foi a Marta! Para ganhar dinheiro, estava sempre pronta.

Onde é que estagiou?

Em Évora, na Casa de Santa Vitória. O fim da vindima calhou com as matrículas e eu matriculo-me em hortofruticultura. Quando conto ao Eng. Bernardo Cabral, ele chama-me maluca e diz que tenha de seguir enologia. Pior: liga para a escola e, à minha revelia, muda-me a matrícula. Sou enóloga graças a ele!

Ou ao tal destino de que tanto gosta de falar. Faz fé que a vida não podia ser outra. As bolhas de espumante colaram-se-lhe aos dias. E ao coração. O telefone toca sem parar. É o filho. Tem 8 anos e um jogo novo. Poderia subir ao último nível num instante, se a mãe embarcasse em pagar. Mas ela sabe bem que valores lhe quer deixar. Ele que suba a pulso, nível após nível, conquista após conquista. O telefone volta a tocar. É a cunhada. Mais uma chamada, agora da sala de enologia. Irrequieta e apaixonada pelo trabalho, Marta não se afasta um dia das lides. Nem da rotina: um bom pequeno-almoço pela manhã, um passeio de bicicleta ao cair do dia. O que mais gosta é de se perder nos montes de Távora-Varosa e do Douro.

Foto: Rui Oliveira

Encontra-se numa posição única no universo do espumante português. Como é que é ser a mulher forte de 3,5 milhões de garrafas, entre as quais algumas das mais conceituadas?

Eu nem sei bem... Sempre a mil que é mesmo assim. O mais difícil é a pré-vindima. Na Raposeira, compramos uvas a 400 agricultores e, na Murganheira, a 100. Conseguir marcar vindima a tanta gente é muito difícil. E eu tenho um defeito, não deixo os estagiários fazerem as maturações, eu é que gosto de fazer isso.

É na prova da uva que se desenha o vinho?

Levo os colegas de enologia para a vinha, mas não os estagiários. É dos momentos mais sérios, é naquela prova que decido o momento exacto em que aquelas uvas têm de ser vindimadas para eu conseguir o vinho que idealizei.

Não confia nos estagiários?

(Risos) É que eu já fui estagiária e lembro-me bem do quanto alguns dos meus colegas eram bandidos!

Conte-me uma história desses tempos.

Uma vez, mandaram-nos fazer a maturação de uma vinha e eu começo a andar pela vinha a colher bagos e o outro estagiário, que era um artista, senta-se junto a uma videira e toca de encher o saco. E eu: “Então, pá?” E ele: “São 250 bagos, não é?” Uma pessoa fica desconfiada.

Foi como estagiária que veio parar às Caves Raposeira?

Também foi um acaso. Eu era para ir para a Estação Vitivinícola Nacional porque só quem ia para lá é que conseguia tirar 19 no estágio. Um dia, um colega diz-me que eu vou estagiar para a adega de um amigo dele. Eu lá acabei por dizer que ia ver a adega. E assim aqui vim parar.

Lembra-se da professora Fernanda Mira? Ela não esquece quanto era uma aluna aplicada. Era obcecada com as notas?

Falou com ela?! Sempre tive a cisma de ter boas notas. Lembro-me de um trabalho da cadeira de Processos Alimentares em que, para ter boa nota, até fui ao Algarve visitar uma fábrica! Não sei explicar, sempre tive a paranoia de fazer o melhor possível.

Como é que foi o primeiro dia na Raposeira? É verdade que ficou muda quando viu o professor Orlando Lourenço?

É verdade, fui criada com uma educação em que o professor era tudo. Eu ficava toda encolhida. E ele já era o dono das duas adegas. Nunca tinha aceitado nenhuma estagiária do ensino superior, mas aceitou-me. Isto era mesmo o destino.

Nunca escondi o que fui, de onde venho, isso para mim nunca foi limitação para nada

Marta entrou na Escola Superior Agrária de Santarém com 22 anos. Na foto, com os pais, no dia da queima das fitas.
Marta entrou na Escola Superior Agrária de Santarém com 22 anos. Na foto, com os pais, no dia da queima das fitas.
Foto: DR

Fala tanto do destino... Está feliz com o seu?

Muito. Já nem me imagino noutro lugar. Há quem diga que eu era para ter nascido filha do professor Orlando. Não nasci, mas vim parar à família.

Como é que foi o estágio?

Ele deixou-me ir para a Raposeira, mas nem pensar em pôr os pés na Murganheira, que era a menina dos olhos dele. Eu já tinha carro, um Renault 5 comercial, que comprei com o dinheiro ganho a trabalhar no LIDL. Lá vinha no meu carrito.

Num dia, morre de vergonha do patrão. No outro, o patrão é sogro. Como é que isso aconteceu?

É uma história engraçada... eu vim estagiar em Março e o engenheiro que mandava começa a dizer que tem o homem perfeito para mim. Eu disse-lhe para esquecer, que já tinha namorado há sete anos. Ele não se convenceu e começou a organizar uns jantares para me juntar com o Herlander. E, olhe, a química foi imediata. Mas eu olhava para ele e só pensava: longe de mim! Coitado, andou quatro meses a chorar. Eu dizia-lhe: “Esquece, toda a gente vai pensar que estou contigo por interesse!” O que mais me cativou no meu homem foi a forma de ser dele, o respeito enorme que tem.

Lembra-se do primeiro dia de namoro?

Perfeitamente! Ele levou-me logo a casa dos pais. E eu aflita, à espera de ser mal recebida. Lembra-se da série “A Mulher do Senhor Ministro”? Estava à espera que a mãe dele fosse assim, uma senhora com aquele cabelo emproado, cheia de nove horas e a chamar-me interesseira. Mas encontrei o oposto. O meu sogro de chinelos a regar o jardim... São as pessoas mais carinhosas, mais simples, mais calorosas....

É uma história digna de novela. Imagino quanto estaria nervosa...

Somos de extractos sociais muito diferentes. Toda a gente poderia pensar que eu estava com ele por interesse. A primeira vez que o meu marido, então namorado, foi a casa da minha família, foi um filme. O meu pai deve ter achado que eu tinha escondido um bocadito a nossa condição social, então, mal o meu homem entra dentro de casa, ele dá um murro na mesa: “Ouve lá pá, estás a ver o que está aqui?! É tudo o que temos! Não estamos aqui para enganar ninguém!”. Nunca escondi o que fui, de onde venho, isso para mim nunca foi limitação para nada.

O dia do casamento chegou feliz. Ela num vestido de ombros livres, ele apertado na gravata. Os dois no altar, olhos emocionados no “sim” da vida. A noiva atrasada três hora e meia. Só havia uma cabeleireira e ela, certa de que pela noiva todos esperavam, mandou os convidados aprumarem-se primeiro. Por sorte, levava apenas 21 convidados, “só as pessoas mais próximas, aquelas com um significado realmente especial”. A cabeleireira a apanhar-lhe o cabelo e ela com lágrimas escondidas. A sogra havia-lhe dito que não estava para atrasos, se a noiva inventasse demoras, nunca mais lhe dirigia o verbo. A rapariga subiu ao altar amedrontada, mas quando o seu olhar bateu no da sogra, todos os medos caíram por terra: “Aquela mulher parece um General, mas é um coração de ouro!”. O telefone continua imparável, o filho, a colega da Raposeira, o filho que conquistou mais um nível.

Marta e Herlander Lourenço casaram em Maio de 2008, na terra da noiva, numa cerimónia com cerca de 90 convidados.
Marta e Herlander Lourenço casaram em Maio de 2008, na terra da noiva, numa cerimónia com cerca de 90 convidados.
Foto: DR

Só falta a sua filha telefonar. Que idade é que ela tem?

Tem 11 anos, tenho um orgulho gigante naquela menina! Excelente aluna e, em casa, sabe fazer um arroz melhor do que eu. A gente não sabe o dia de amanhã. Eles têm de ser desenrascados.

Também começou a cozinhar cedo?

Até trabalhei a cozinhar! O meu primeiro emprego foi no Eduardo’s Bar, em Arganil, fazia de tudo na cozinha: hambúrgueres, tostas... Mas pagavam muito mal e, um dia, consegui lugar no LIDL. Mais tarde, fiquei no supermercado e num restaurante. Estive um ano a servir às mesas e outro como cozinheira.

Qual era a sua especialidade?

Costeletão de novilho grelhado, com batata frita, couve troncha e feijão à moda antiga, que é feijão cozido com cebolada. É delicioso! Às vezes, ainda faço em casa, o meu marido adora.

É verdade que o desporto é paixão antiga?

Fiz ginástica acrobática e fui federada no futebol feminino!

Jogava em que posição?

Era defesa direito. Agora, tenho o vício da bicicleta.

Costumo dizer que falo com as uvas e com o vinho. É que falo mesmo! É na prova na vinha que imagino os vinhos

Voltemos ao vinho. É mais difícil fazer um espumante do qual produz milhares de garrafas ou um Murganheira de que fazem poucas garrafas?

Eu costumo dizer que falo com as uvas e com o vinho. É que falo mesmo! É na prova na vinha que imagino os vinhos. É muito mais difícil fazer um espumante de muitas garrafas. Quando é para um espumante de poucas garrafas, eu delineio e é tudo feito ao pormenor desde a vindima, são os meus bebés.

O vinho é dado a modas. O espumante também?

Hoje, estão na moda os espumantes com notas de evolução logo muito cedo. Isso não me diz nada. Sei que basta deixar oxidar o mosto. Para mim, a beleza está quando, num espumante com 10 ou 15 anos, ainda encontramos toda a fileira de aromas: primários, secundários, terciários e quaternários. Isso faz-me vibrar!

Champanhe são espumantes feitos na região de Champanhe, em França. Mas a denominação de origem tornou-se uma marca tão forte que assombra todos os outros espumantes. Como é que os seus espumantes sobrevivem a isso?

É uma realidade, o espumante é subalterno do champanhe. A origem está neles, nós aprendemos com eles. Ainda sentimos muito isso, mas menos do que há uns anos. Sinto que a Murganheira vende pelo seu nome e não pela designação espumante. A administração desta casa nunca me pôs nenhum entrave a investir na qualidade.

Há uns tempos, o Luís Pato disse-me que não gostava que se falasse em espumante, pois esse nome fazia lembrar o spumanti italiano, bebida que não aprecia nada. Também não gosta da palavra espumante?

O Luís Pato é um senhor. Eu sinto é que nos faz falta um nome para o espumante feito pelo método tradicional, com leveduras livres. A Murganheira tem tido uma luta muito grande para conseguir um nome que nos distinga. Até já temos ido à Assembleia da República. Não se pode continuar a misturar tudo e temos muitos produtores em Portugal a fazer espumante pelo método tradicional.

O espumante português é muito barato comparado com o de outros países?

É. Em relação com Champanhe percebe-se, além do nome, há a questão do preço da matéria-prima, da uva. Em Champanhe, o quilo ronda 7,20 euros. Aqui, em média, um quilo são 60 cêntimos.

Espumante é glamour. Como é que uma miúda do campo se move neste mundo?

Ui! É difícil! Uma pessoa tem de saber estar para a ocasião, mas eu gosto é de andar por aí de ténis e calças de ganga.

A nível mundial, o vinho português nunca esteve tão na moda quanto hoje. E o espumante?

Ainda não chegámos lá, mas a situação tem melhorado. Muitos jornalistas estrangeiros ficam surpreendidos com a qualidade dos nossos espumantes. A fama do vinho português deve muito aos vinhos do Douro. Antes, Portugal só era conhecido pelo Vinho do Porto.

Gosta de comprar vinho?

Adoro! Perco a cabeça.

Qual foi o vinho mais caro que já comprou?

Um Barca Velha.

Gosta de abrir um espumante com o método de sabragem ou retirando apenas a rolha?

A sabragem é bonita, é o tal glamour do espumante. Mas eu abro de forma normal. Tem é de fazer barulho!

Vai entrar em 2022 com estrondo?

Claro! Abrir uma garrafa de espumante é alegria, tem de fazer paw!

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