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União Europeia de Saúde. Já HERA mas agora é que vai ser
Sociedade 5 min. 22.09.2021 Do nosso arquivo online
Emergências sanitárias

União Europeia de Saúde. Já HERA mas agora é que vai ser

Emergências sanitárias

União Europeia de Saúde. Já HERA mas agora é que vai ser

Foto: AFP
Sociedade 5 min. 22.09.2021 Do nosso arquivo online
Emergências sanitárias

União Europeia de Saúde. Já HERA mas agora é que vai ser

Telma MIGUEL
Telma MIGUEL
Com milhões de euros para emergências sanitárias, o novo departamento da Comissão foge ao escrutínio dos eurodeputados.

É o "tijolo" que faltava na arquitetura da União Europeia de Saúde. Ou, se preferirem, um pilar fundamental para garantir que a União Europeia esteja preparada para a próxima emergência de saúde. Esta é a convicção do vice-presidente da Comissão Europeia Margaritis Schinas Mas atenção: a HERA (Autoridade Europeia de Preparação e Resposta a Emergências Sanitárias) não é exatamente uma nova agência de saúde europeia, mas mais um departamento inserido na estrutura da Comissão Europeia, com um orçamento base de 6 mil milhões de euros até 2027.

A ideia da HERA (acrónimo a partir do nome em inglês) começou a nascer há um ano, e formalizou-se com as lições aprendidas com a covid-19. Stella Kyriakides, a comissária responsável pela Saúde, apresentou aos jornalistas um exercício de regresso ao passado para se perceber a necessidade e a urgência da nova autoridade. "A resposta à covid-19 foi dada, mas com soluções ad hoc", disse, "mas se tivéssemos a HERA teria sido significativamente diferente. A HERA teria visto a crise a chegar, depois seria ativada a pesquisa e inovação e as contramedidas médicas e teria apoiado o desenvolvimento e produção das vacinas necessárias para produção à escala adequada. E teria tido a capacidade de tomar medidas rápidas, de ativar o financiamento e negociar os contratos com as farmacêuticas". Não quer dizer que tudo isto não tivesse sido feito, mas foi, disse Kyriakides, sem uma estrutura pré-existente.

Em plena crise de falta de vacinas na UE, no primeiro trimestre deste ano, Thierry Breton, o comissário do Mercado Interno, foi encarregue de coordenar uma task force para garantir a produção e a distribuição das doses contratadas para os europeus perplexos com a falta de stock. "Tivemos que inventar", conta o francês, lembrando que foi preciso analisar a cadeia de fornecimento de matérias-primas, para encontrar os engarrafamentos, e promover "namoros" entre fábricas e fornecedores para criar pontes e aumentar a capacidade industrial. "Agora toda a gente se conhece". A HERA vai servir também para isso: escalar a produção e garantir que ao nível europeu os equipamentos e medicamentos necessários possam estar prontos assim que precisos. A equipa de trabalho dirigida por Breton criou "uma cartografia em tempo real" das fábricas e da cadeia de fornecimento e de produção do setor da saúde.

A mulher de Zeus sabe tudo

A autoridade de prevenção que entrou em funções imediatas sob a tutela da Direção-Geral de Saúde irá já começar a trabalhar na luta contra as variantes do SARS-CoV-2, mas o seu papel a longo prazo será o de prospeção de potenciais riscos e de coordenar a luta contra essas crises de saúde que não conhecem fronteiras. Uma espécie de oráculo científico. O grego Schinas invocou, aliás, o seu conhecimento de mitologia clássica para explicar o papel do novo departamento da Comissão: "Hera é a mulher de Zeus, e como mulher do patrão ela sabe tudo. E é este poço de sabedoria que vai ser importante para nós". A HERA da Comissão cumpre um papel que a crise da covid-19 mostrou estar a descoberto. A EMA (Agência Europeia do Medicamento) – entidade que aprova a comercialização de produtos farmacêuticos – e o ECDC (Centro Europeu de Prevenção e Controle de Doenças) "estão a trabalhar com coisas que já estão a acontecer". Faltava, disse Schinas, "a capacidade de fazer soar o alarme, antes de a ameaça sanitária nos atingir em cheio".

Para ilustrar as potencialidades do novo elemento da arquitetura da União Europeia de Saúde (que a Comissão está a criar), Margaritis Schinas apresentou uma capa da revista The Economist em que a bandeira da UE surgia sob o título: "O que correu mal". "Foi contra isto que tivemos que lutar, e ultrapassámos a crise apesar das Cassandras e dos profetas da desgraça que tentaram convencer os europeus que não nos safávamos", desabafou. De seguida exibiu o gráfico com a curva da vacinação da UE, com mais de 70% da população completamente inoculada: "Somos o 'país' do mundo com a maior taxa de vacinação".

A HERA não será uma autoridade estática. No "período de paz" tenta antecipar; no período de crise, terá poderes extra e capacidade de reação rápida, coordenando a resposta – por exemplo, a produção e a distribuição das "contramedidas" e a possibilidade de negociar contratos. Em termos funcionais, tem a cooperação dos Estados-membros, havendo um representante de cada um dos 27 países, e alojará também um membro do Parlamento Europeu, com o estatuto de observador e direito a votar o orçamento.Pierre Delsaux, atualmente diretor-geral adjunto da DG Saúde da Comissão Europeia, será o responsável máximo

Transparência contra o lóbi farmacêutico

A necessidade de a HERA funcionar como um serviço interno deriva da urgência, justificou Schinas: "Criar uma agência é um processo complexo, assim, podemos começar a trabalhar hoje e atingir velocidade plena no início de 2022".

Seis mil milhões de euros de orçamento de base servem para os "períodos de paz", mas a HERA poderá movimentar um total de 24 mil milhões de euros de vários programas europeus, o que no total poderá perfazer 30 mil milhões em cinco anos. Com tanto dinheiro a fluir entre contas bancárias e em períodos de crise – quando as faturas são menos escrutinadas -, vários eurodeputados já criticaram o facto de o Parlamento Europeu ter apenas o papel de 'observador' nesta nova estrutura. A eurodeputada francesa dos Verdes Michèle Rivasi – que lutou para que os contratos confidenciais das vacinas entre a Pfizer, Moderna e AstraZeneca fossem mostrados – salientou que a Comissão "quer dar todo o poder ao lóbi farmacêutico por baixo da mesa. Esta proposta tem que ser retirada!".

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