Um terço dos doentes covid-19 desenvolve doenças mentais ou neurológicas
Um terço dos doentes covid-19 desenvolve doenças mentais ou neurológicas
Uma em cada três pessoas que foram infetadas com covid-19 pode desenvolver problemas de saúde mental ou neurológicos até seis meses depois de recuperar.
A conclusão é de uma investigação publicada, esta terça-feira, na revista Lancet Psychyatry, o "maior estudo" deste género, realizado até à data, segundo a equipa de investigadores.
"Foram relatadas sequelas neurológicas e psiquiátricas da covid-19, mas são necessários mais dados para avaliar adequadamente os seus efeitos na saúde cerebral", começam por referir os cientistas, que tiveram como objetivo "fornecer estimativas robustas das taxas de incidência e dos riscos relativos dos diagnósticos neurológicos e psiquiátricos em pacientes nos seis meses seguintes a um diagnóstico da covid-19".
Apesar do reconhecimento de que são precisos mais dados, as conclusões do estudo apontam já alguns problemas concretos, com a ansiedade e perturbações de humor a aparecerem entre os mais comuns.
Os investigadores notam que 34% dos 236.379 pacientes com covid-19 analisados - a análise foi feita a partir dos seus registos eletrónicos - foi diagnosticado com uma doença neurológica ou psiquiátrica, num prazo de seis meses após a infeção.
A investigação, apoiada pelo Centro de Pesquisa de Saúde Biomédica de Oxford, concluiu que a ansiedade (17%) e as perturbações do humor (14%) foram os diagnósticos mais comuns.
Para 13% do universo investigado, este foi o primeiro diagnóstico neurológico ou psiquiátrico que tiveram de fazer, o que aponta para que não tivessem antecedentes nesse aspeto.
A incidência de condições neurológicas, como hemorragia cerebral (0,6%), AVC (2,1%) e demência (0,7%) foi globalmente mais baixa, mas o risco foi geralmente maior entre os pacientes que tinham estado gravemente doentes.
Em doentes graves o risco de problemas neurológicos afeta quase metade
A investigação concluiu também que o risco de desenvolver perturbações a longo prazo é maior em doentes hospitalizados com sintomas graves da doença, atingindo quase metade.
Segundo o estudo, 46% dos pacientes internados nos cuidados intensivos apresentaram um diagnóstico de perturbações neurológicas ou psiquiátricas seis meses após a infeção.
Quase 7% dos pacientes que tiveram de ser reanimados tiveram um AVC a seguir, 2,7% sofreram uma hemorragia cerebral e quase 2% desenvolveram demência, por comparação, respetivamente, com 1,3%, 0,3%, e 0,4% dos doentes covid-19 que não foram hospitalizados.
Impacto da covid-19 maior que o da gripe e de outras doenças respiratórias
Os investigadores também examinaram dados de mais de 100.000 pacientes com um diagnóstico de gripe e mais de 236.000 pacientes diagnosticados de infeções respiratórias.
Foi detetado que o risco de diagnósticos neurológicos ou psiquiátricos, em geral, era 44% mais elevado após a covid-19 do que depois da gripe, e 16% mais elevado do que após uma infecão do trato respiratório.
Sequelas tornam-se crónicas e sistemas de saúde têm de se preparar
Paul Harrison, investigador da Universidade de Oxford e autor principal do estudo salienta que, embora o risco individual da maioria destas perturbações neurológicas e psiquiátricas seja baixo, o efeito nos sistemas de saúde pode ser "considerável" devido à escala da pandemia.
Por outro lado, aponta que muitas destas perturbações são "crónicas" e é preciso que os sistemas de saúde sejam dotados de recursos "para lidar com as necessidades" que se avizinham.
Estes dados "confirmam a alta taxa de diagnósticos psiquiátricos após a covid-19 e mostram que também ocorrem problemas sérios no sistema nervoso, tais como acidentes vasculares e demências, que embora mais raros, são significativos, sobretudo em quem teve casos graves de covid-19", remata.
Max Taquet, co-autor do estudo acrescenta que falta agora perceber "o que acontece para além dos seis meses".
"O estudo não consegue revelar os mecanismos envolvidos mas evidencia a necessidade de investigar urgentemente para os identificar, prevenir ou tratar", defende.
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