Escolha as suas informações

UE quer ser líder na nova ordem de saúde global
Sociedade 6 min. 30.11.2022
Pós-pandemia

UE quer ser líder na nova ordem de saúde global

Pós-pandemia

UE quer ser líder na nova ordem de saúde global

Foto: Shutterstock
Sociedade 6 min. 30.11.2022
Pós-pandemia

UE quer ser líder na nova ordem de saúde global

Telma MIGUEL
Telma MIGUEL
Antecipar os próximos sustos de epidemias, reverter a queda dos índices de saúde no mundo e reformar a OMS estão na lista da estratégia da União Europeia para criar uma nova ordem de saúde global depois de a covid ter mostrado que uma doença é um risco geopolítico.

A pandemia da covid-19 trouxe para a ribalta a necessidade de não encarar a saúde como um dado adquirido, nem como uma questão meramente individual. E, também, que não é só um problema científico e médico. 

“A saúde é um elemento fundamental de segurança internacional e das políticas comerciais”, disse esta tarde, o Alto Representante para as Relações Externas da UE, Josep Borrell. Se antes da covid-19 esta ideia era difícil de conceber, hoje - passados mais de dois anos desde a declaração da doença provocada pelo SARS-Cov-19 como pandemia – ela é quase óbvia. 


Um trabalhador realiza um teste covid-19 a uma mulher, numa estação de testes em Pequim, capital chinesa.
OMS identifica vírus e bactérias que podem causar novas pandemias
Cerca de 300 peritos vão compilar uma nova lista de agentes patogénicos.

Muitas descobertas foram feitas quando a covid-19 fechou o mundo em casa. A Europa confrontou-se com algumas delas, e desagradáveis. “Lembram-se quando percebemos que não havia um único grama de paracetamol a ser produzido na Europa?”, lembrou Borrell. A Europa também não produzia luvas, máscaras e ventiladores suficientes. “O que significa que precisamos de uma abordagem de saúde que adquiriu uma importância geopolítica significativa. Já não é apenas um assunto de ‘pharma’ e médicos, é um assunto geopolítico”, defendeu.

Além de ter sido uma lupa para o que estava mal, a covid-19 também teve o efeito de acelerar as desigualdades a nível mundial. E entre os 17 "Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para 2030", delineados pela ONU, e que estavam a alcançar sucesso, muitos foram anulados em dois anos de pandemia. “Agora temos que fazer tudo o que é possível para reverter a tendência e subir as metas de saúde para 2030”, defendeu Borrell na apresentação da Estratégia de Saúde Global da UE.

Produzir em África 60% das vacinas para os africanos

Com uma nova ordem mundial de saúde, é objetivo da União Europeia “aumentar a sua liderança”, nesta área, defendeu a comissária europeia para as Parcerias internacionais, Jutta Urpilainen. A estratégia global na área da saúde pretende “aumentar a soberania e autonomia dos parceiros”, neste momento especificamente em África, na América Latina e nas Caraíbas. 

Em relação a outros “atores globais”, Urpilainen salientou que a UE faz a diferença. “O que fazemos é apoiar o desenvolvimento de sistemas de saúde básicos e, ao mesmo tempo, reforçar a capacidade de produção de produtos médicos”, nos países. E esta dupla vertente é, segundo a comissária, “um reflexo da maneira inovadora de olhar para o futuro”.


Mais de 35 mil mortes por ano na Europa por resistência a medicamentos
Em causa está "o uso desnecessário" de antimicrobianos como antibióticos, antivirais, antifúngicos e antiparasitários.

Neste momento, as equipas de saúde europeias estão a trabalhar com quatro países africanos: Senegal, África do Sul, Ruanda e Gana. Segundo Urpilainen a Comissão está “a apoiar os esforços destes países de produzirem no futuro 60% das vacinas usadas em África para os africanos”. Em 2023 deverá arrancar a produção no Ruanda.

Outro dos aspetos do apoio a estes parceiros, será a digitalização dos sistemas de saúde, o esforço na educação e o desenvolvimento de competências para reforçar a força de trabalho.

A UE e os seus Estados-membros estão entre os maiores financiadores da saúde global hoje em dia, considerou Jutta Urpilainen, o que não quer dizer que ao longo de todo o tempo essa generosidade tenha sido eficaz. Durante a pandemia e em face da urgência, conseguimos juntos, com instituições financeiras e E-m, responder às consequências de saúde e económicas. Feitas as contas, 53.7 mil milhões de euros foram prometidos em apoio dos países parceiros, dos quais 47.7 mil milhões já foram gastos. Esta situação, descrita pela comissária para as Parcerias Internacionais, “posicionou a UE como um reconhecido herói na saúde global”.

Por causa desse posicionamento está na altura, disse Urpilainen, de “aumentar a nossa voz a nível multilateral para sermos além de grandes pagadores uma voz ativa nestas questões”.

Próximas pandemias e globalizar o acesso à saúde

A agenda europeia para a saúde global para os próximos dez anos não é só baseada em “princípios e valores, é também baseada em ações”, salientou a comissária europeia para a Saúde, Stella Kyriakides. 

“A covid foi o pano de fundo e o soar do alerta”, mas já havia muitos indícios do que estava para acontecer. “Se olharmos para trás, nos últimos 30 anos fomos confrontados com o HIV, com o vírus da Zika, com o ébola, com a gripe aviária. E a lista continua, sendo os mais recentes a covid-19 e a varíola dos macacos”.


Mais de 300 crianças e jovens morrem todos os dias por causa do VIH
Há 2,7 milhões de menores que vivem com VIH no mundo.

"Uma pandemia estava prestes a acontecer, era só uma questão de quando. Por isso, já se sabe, o futuro trará novas ‘surpresas’. Uma das mais preocupantes, e que poderá ser a próxima, “é a pandemia silenciosa, como muitas vezes a chamamos, da resistência aos antibióticos”.  Dado adquirido é que “as crises de saúde não estão só a aumentar de escala, mas também estão a ficar mais frequentes”.

“Os sinais de alerta existiam há muito tempo, mas quando a covid apareceu nós estávamos claramente mal preparados a nível global. Estes surtos sublinham a interconectividade da saúde. Já não podemos ignorar a ligação entre a saúde dos humanos, e da natureza, tão clara nas doenças zoonóticas”. 

Neste momento, disse Kyriakides, é preciso “uma nova ordem de saúde global para reverter as tendências de perda dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, e para melhorar lutar contra os próximos riscos de saúde mundiais”. E para esta nova ordem de saúde mundial que está a nascer, a União Europeia “aceita liderar esse processo”, disse Kyriakides.

Através da HERA, a entidade europeia criada o ano passado de prevenção para riscos globais de saúde, já assinou parcerias com uma instituição semelhante americana e vai celebrar acordos com o Japão e a Coreia do Sul. E, disse Kyrakides, “nas próximas semanas vamos assinar parceria com o Organização Mundial de Saúde”. 

Através dessa parceria, a UE fornecerá apoio “para o desenvolvimento e acesso a medidas de prevenção da covid, a contratação de vacinas para a varíola dos macacos e o financiamento de ensaios clínicos para a vacina do ébola”.

Esta liderança que a UE quer ter vem traz a sua parcela de responsabilidades: “O tipo de responsabilidades que demostrámos com as doações e a exportação de vacinas, quando outros usaram o chamado ‘nacionalismo de vacinas’”, lembrou Stella Kyriakides. Mas a intervenção da UE a nível da saúde global irá “para além das pandemias. Temos que cobrir as causa de base das deficiências na saúde, quer sejam económicas, sociais ou ambientais Sempre pondo as pessoas no centro”.


OMS altera nome da doença Monkeypox para "mpox"
Os dois nomes poderão ser utilizados simultaneamente durante um ano, período após o qual o nome monkeypox será eliminado.

Alguns dos objetivos a atingir nos países parceiros, em África, Caribe e América Latina, o foco está no acesso de todos aos cuidados de saúde primários e no acesso a vacinas na infância, sobretudo para mulheres e raparigas.

Uma OMS reformada, com a UE sentada à mesa

Outro dos objetivos europeus para se tornar um campeão da saúde mundial é incentivar as mudanças na Organização Mundial de Saúde (OMS). Incluindo “lutar por uma OMS mais eficaz e mais responsabilizada e que seja financiada de forma sustentável e onde nós, como UE, tenhamos um lugar à mesa”. Kiryakides defende que a UE deve começar por ter um estatuto de observador para passar a ser um membro desta organização da ONU.

Para fazer avançar uma nova ordem mundial de saúde, a UE vai precisar de parceiros entre os Estados-membros e parceiros mundiais. “Estamos a trabalhar com os EUA e com os G7 de forma a podermos falar a uma única voz”, explicou Kyriakides.

 

O Contacto tem uma nova aplicação móvel de notícias. Descarregue aqui para Android e iOS. Siga-nos no Facebook, Twitter e receba as nossas newsletters diárias.


Notícias relacionadas

Relatório Estratégico da UE
Um relatório da Comissão Europeia sobre as ameaças futuras dá pistas de como o bloco pode sobreviver num mundo de escassez e de nova ordem internacional.
As alterações climáticas e outros desafios ambientais são consideradas como algumas das principais ameaças do futuro.
A Europa registou, na semana passada, um total de 1.104.121 novos casos positivos de covid-19, uma situação que a Comissão Europeia classificou hoje como "dramática", destacando também o "aumento do número de mortes" nos últimos dias.
Comissária Europeia da Saúde, Stella Kyriakides.