Quem matou Diana? Tudo o que se sabe desta história
por Tiago RODRIGUES/ 23.11.2022
Partes desaparecidas do corpo foram encontradas na Alemanha. Mas o mistério em volta do crime continua. Já têm o corpo completo? Qual é a causa da morte? Há mais do que um suspeito? Tudo o que se sabe até agora.
Enigma
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Foi uma descoberta horrível naquela terça-feira, feriado do primeiro de novembro, Dia de Todos os Santos. Um caminhante que passava junto à estrada nacional que serve a pequena cidade alemã de Temmels, na fronteira com o Luxemburgo, viu algo assustador. Eram cerca das 14 horas quando ligou para a polícia a dizer que tinha encontrado partes de um corpo humano num arbusto perto de um parque de estacionamento. As autoridades foram para o local. O aparato e as notícias inquietavam a população da pacata vila. Que crime é este? A quem pertencem os restos mortais?
A polícia de Trier começou imediatamente as buscas por outras partes do corpo, sem revelar o que já tinha sido encontrado. À imprensa, o porta-voz Uwe Konz dizia apenas que era importante "encontrar um nome e um rosto" para identificar a vítima. Não se sabia ainda se era homem ou mulher. As autoridades alemãs acreditavam tratar-se de um crime recente e admitiam a hipótese de ter sido cometido num país vizinho. Do Luxemburgo surgia um particular interesse na descoberta: poderiam estas ser as partes desaparecidas do corpo de Diana Santos? Havia um novo enigma por resolver.
As buscas continuaram no dia seguinte. Centenas de polícias cobriram uma grande área florestal, com a ajuda de drones e cães farejadores. As autoridades luxemburguesas também estiveram envolvidas. Nas notícias, aumentava a expectativa sobre uma possível ligação com o corpo desmembrado que havia sido descoberto por um jovem em Mont-Saint-Martin no dia 19 de setembro. Mas que partes foram encontradas? Um jornal local avançava que seriam a cabeça e as pernas e que as buscas teriam como objetivo encontrar os outros membros. Sem sucesso.
Terminadas as buscas, restava às autoridades esperar pelos resultados das investigações forenses para identificar a pessoa. A autópsia e uma análise de ADN foram realizadas no Instituto de Medicina Legal da Universidade de Mainz. Ao Contacto, Uwe Konz confirmava que a ligação a Diana Santos era uma "forte possibilidade", mas só o teste de ADN daria a certeza e o resultado poderia demorar vários dias. O porta-voz revelava ainda que a polícia de Trier estava em "contacto próximo" com as autoridades do Luxemburgo, apesar de continuar a investigar em "todas as direções".
Nos dias que se seguiram, a especulação ia crescendo. A imprensa alemã procurava respostas para este crime de uma violência sem precedentes naquela região do Moselle. Seriam estas as partes do corpo de Diana? No Grão-Ducado, aguardava-se a confirmação por parte da Alemanha. O Ministério Público de Diekirch, que está a investigar o caso da morte da portuguesa, respondia ao Contacto que não era possível "afirmar ou negar" uma ligação com o corpo encontrado em Mont-Saint-Martin e que teriam de esperar pelo resultado do ADN. A família, em Portugal, ganhava uma nova esperança de recuperar o corpo.
A revelação só surgiu no dia 15 de novembro, duas semanas depois: os membros encontrados em Temmels pertencem, de facto, a Diana. Num comunicado, a polícia de Trier anunciava que após a "análise complexa" do ADN não havia dúvidas de que as partes do corpo são da portuguesa que havia sido encontrada morta em França dois meses antes. Pouco depois, o Ministério Público de Diekirch também emitiu um comunicado a confirmar a correspondência do ADN e a lembrar que "a investigação judicial luxemburguesa prossegue", notando que, "nesta fase, não é apropriado comunicar outros elementos".
Angústia
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As notícias da descoberta das partes desaparecidas de Diana em Temmels correram vários países. A investigação que já envolvia autoridades do Luxemburgo, França, Bélgica e Portugal agora também inclui a Alemanha. A polícia de Trier anunciava que o intercâmbio com a polícia luxemburguesa ainda está em curso e não excluía a possibilidade de serem realizadas novas buscas. Continua sem se saber que partes do corpo foram encontradas. Tanto as autoridades alemãs como as luxemburguesas responderam ao Contacto que não podem revelar para já essa informação.
Em meados de outubro, o Ministério Público de Diekirch solicitou que a parte do corpo encontrada em França fosse transportada do instituto forense de Nancy – onde foram feitas as primeiras perícias médico-legais – para o Luxemburgo, para que fosse realizada uma nova autópsia. O exame inicial revelou que o cadáver não apresentava hematomas visíveis, nem sinais de ferimentos de bala, ou faca, ou violência sexual. Também não tinha vestígios de sangue nem estava em degradação profunda, levando as autoridades a crer que foi desmembrado noutro local e que Diana terá sido morta nas 24 horas antes de o corpo ser encontrado.
Em relação à autópsia das partes do corpo encontradas em Temmels, ainda não há qualquer comunicação por parte das autoridades além da confirmação da ligação do ADN. Estas perícias poderiam ajudar a apurar finalmente a causa da morte de Diana. Por enquanto, os restos mortais ainda estão na Alemanha e, segundo Uwe Konz, cabe agora ao Ministério Público de Trier "decidir quando os vai libertar para o Luxemburgo". Resta saber se autoridades já têm todas as partes desaparecidas – cabeça, pernas e braços – ou se vão continuar as buscas pelo corpo da portuguesa.
Só depois de todos os exames médico-legais terem sido finalizados no Luxemburgo é que o corpo será trasladado para Portugal para que a família possa por fim realizar o funeral de Diana. Para os familiares, a espera tem sido uma angústia. Já passaram mais de dois meses desde a primeira descoberta em Mont-Saint-Martin e, desde então, nunca receberam uma comunicação por parte das autoridades luxemburguesas. Segundo o pai, a polícia judiciária portuguesa só foi a casa da mãe e do irmão, em Vila do Conde, para dar a notícia da morte de Diana quase um mês depois.
A família só soube através das notícias que as partes do corpo encontradas na Alemanha são da portuguesa. Ao Contacto, Horácio Santos contava como reagiu à descoberta. "Desapareceu-me o chão. A morte da minha filha foi de uma brutalidade que eu não entendo. Isso é o que me perturba mais", desabafava o pai, criticando o facto de não ter recebido qualquer informação por parte das autoridades, que foram sempre "muito frias com a família". Até hoje, só recebeu respostas do cônsul honorário do Luxemburgo no Porto, António Oliveira, que lhe garantiu apenas que o caso estava a ser seguido pelo Consulado.
Desesperado, o pai também enviou um email ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. Este respondeu-lhe que deveria entrar em contacto com o Ministério dos Negócios Estrangeiros. Enviou um novo email, mas não obteve resposta até ao momento. Questionado pelo Contacto, o Cônsul-Geral no Luxemburgo, Jorge Cruz, disse apenas: "Nada tenho a comentar". Por sua vez, o Ministério Público de Diekirch garantiu estar disponível para falar com a família. Horácio já contactou o Parquet e continua a aguardar informações sobre o corpo da filha.
Segredo
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O caso da morte de Diana Santos continua envolto em grande mistério e mediatismo. No Luxemburgo, até já chegou ao parlamento. A ministra da Justiça, Sam Tanson, e o ministro da Segurança Interna, Henri Kox, foram questionados sobre o que é que acontece às pessoas que entram no Grão-Ducado sob o pretexto de um casamento arranjado, numa aparente alusão ao alegado matrimónio por conveniência da portuguesa com um cidadão marroquino. Os ministros responderam que "essas pessoas se expõem a processos criminais e correm o risco de perder o estatuto de 'casado'".
De acordo com o artigo 387.º do Código Penal do Luxemburgo, os casamentos arranjados são puníveis com prisão de seis meses a dois anos e multa de 10 mil a 20 mil euros. Já o artigo 146-1 do Código Civil estipula que o casamento também não é "válido" se se tratar apenas de obter uma vantagem em relação à permanência no país através da condição de cônjuge. Se em tais casos o casamento tiver ocorrido, este pode ser dissolvido a pedido de um ou de ambos os cônjuges, do Ministério Público e de qualquer outra pessoa que nele tenha interesse, segundo o artigo 184.º.
Diana terá casado com um homem de nacionalidade marroquina, chamado Gibran Banhakeia, no dia 14 de julho, em Ettelbruck. Este seria um casamento arranjado, a troco de uma elevada quantia de dinheiro, para que o homem, que terá entre 35 e 40 anos, obtivesse os documentos para residência no país. Até ao momento, o Contacto não obteve a confirmação, através das entidades competentes, de que este casamento realmente aconteceu. Mas conseguiu apurar que houve de facto uma cerimónia em que estiveram presentes o tio de Gibran, Said, com a mulher e os dois filhos, e o irmão deste, Brahim, que vive na Alemanha e também estará envolvido no esquema.
Gibran terá chegado ao Grão-Ducado nos primeiros meses deste ano, vindo de Paris. Estava a tirar um doutoramento na Universidade de Lorraine, em Metz, desde o ano passado, mas não renovou a inscrição para o corrente ano letivo. No final de julho, já depois do alegado casamento, Gibran e Diana arrendaram uma casa em Diekirch, que queriam renovar para depois colocar os vários quartos a alugar. Essa casa foi alvo de buscas e selada pela polícia, que não confirmou se aquele poderia ser o local do crime. O homem continua desaparecido e as autoridades não confirmaram ainda se ele é considerado suspeito e se está a ser procurado.
Até agora, só uma pessoa foi detida. Said Banhakeia, 48 anos, está em prisão preventiva na penitenciária de Schrassig desde o dia 6 de outubro, acusado de homicídio "com premeditação". É considerado pelas autoridades o principal suspeito do crime. Segundo o Contacto conseguiu apurar, a casa de Said, em Diekirch, a poucas centenas de metros da casa de Diana e Gibran, foi também alvo de buscas. A mulher ainda vive lá. Diz que a polícia apreendeu vários itens, como a máquina de lavar roupa e um cesto, facas e toalhas de cozinha, telemóveis e os tablets dos filhos.
As autoridades continuam agora a investigar as últimas horas da vida de Diana. O último namorado da portuguesa, que pediu para não ser identificado, contou ao Contacto que tinham combinado encontrar-se em Diekirch naquele domingo, dia 18 de setembro. Numa videochamada, Diana pediu-lhe para ir ter com ela a casa, onde estavam também Gibran e outra mulher, que seria a namorada deste. Apesar de estarem alegadamente casados, tanto a portuguesa como o marroquino mantinham outras relações amorosas. Said não estaria lá naquele momento, mas Diana terá confessado ao namorado que tinha medo que ele aparecesse.
Quando o companheiro chegou à estação de Diekirch, ao início da tarde, Diana não apareceu. O telemóvel estava desligado. Foi até à casa dela, mas encontrou a porta e as janelas fechadas. Àquela hora, Diana já poderia estar morta. Será aquela casa vermelha o local do crime? Os resultados das perícias da judiciária darão a resposta.
O Contacto apurou que a polícia utilizou as câmaras de vigilância dos vizinhos para observar as movimentações de Said e Gibran naquele domingo e nos dias a seguir. Segundo o advogado, Said afirma ser "inocente". Daniel Baulisch reconhece que foram encontrados "indícios suficientes" para que fosse detido, mas assegura que a investigação "ainda está no início" e que pode haver "mais um ou dois suspeitos". Por enquanto, está em segredo de justiça.
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