QAnon acusa António Costa de "instaurar ditadura de extrema-esquerda" em Portugal
QAnon acusa António Costa de "instaurar ditadura de extrema-esquerda" em Portugal
Os portugueses apoiantes do QAnon, dos Estados Unidos, adaptaram o "universo conspirativo" do movimento à realidade portuguesa para acusar o Governo do PS de "instaurar uma ditadura de extrema-esquerda no país", segundo um relatório europeu divulgado esta terça-feira.
O movimento de teóricos da conspiração QAnon, inspirado por um anónimo do Governo norte-americano, que assina 'Q', garante que o ex-presidente Donald Trump é o protetor da sociedade americana contra judeus e pedófilos e associa os democratas ao tráfico de crianças, canibalismo e rituais satânicos.
Portugueses de extrema-direita em redes sociais negacionistas com origem na Alemanha e França
O relatório "Estado de ódio – o extremismo de direita na Europa" escreve que em Portugal "tem havido uma mobilização significativa de extrema-direita nas redes sociais, propagando teorias da conspiração, propaganda e notícias falsas sobre a crise pandémica de covid-19".
"Há pelo menos 250 elementos de extrema-direita portugueses bem inseridos nas redes sociais negacionistas, com o centro do movimento na Alemanha e em França, coordenando as suas manifestações em Lisboa que decorrem nos mesmos dias que decorrem outras em Berlim e Paris, geralmente aos fins-de-semana", acrescenta ainda o documento.
"O universo da conspiração foi adaptado à realidade portuguesa: o governo do Partido Socialista é acusado de instaurar uma ditadura de extrema esquerda no país, Bill Gates é o responsável pela pandemia, a rede 5G está relacionada com o coronavírus e as vacinas são falsas e produto de uma conspiração global", lê-se no texto.
A parte portuguesa deste relatório, que retrata a situação em vários países europeus, é da autoria de dois jornalistas que se dedicam ao estudo da extrema-direita, Ricardo Cabral Fernandes e Filipe Teles, que descrevem a relação dos apoiantes portugueses ao movimento.
O relatório anual de segurança interna de 2019, publicado em 2020, alerta mesmo que, "em Portugal, a extrema-direita tem vindo a reorganizar-se, reciclando discurso, formando novas organizações e recrutando elementos junto de determinadas franjas sociais a que normalmente não acediam num passado não muito distante" . Assinala a "normalização" política do Chega em 2020 e alerta para a "possibilidade de radicalização das formas de protesto da extrema-direita portuguesa".
Acordo com PSD e direita nos Açores contribuiu "mais para legitimar o Chega"
Depois de o partido de extrema-direita ter eleito um deputado nas legislativas de 2019, o relatório assinala que o acordo com o PSD e outros partidos de direita para formar Governo na região autónoma dos Açores "foi visto como um primeiro passo para um acordo parlamentar ou de Governo a nível nacional", contribuindo "mais para legitimar o Chega".
O documento destaca que o racismo em Portugal foi evidente numa série de atos violentos, como a agressão de uma mulher num autocarro, pela polícia, por o filho não ter bilhete ou ainda pela morte, nas ruas num subúrbio de Lisboa, de um ator, Bruno Candé, por um homem que o mandou "para a senzala", um termo que remete para o passado do esclavagismo em África.
O Chega, segundo o relatório, fez elevar as "narrativas-chave" de extrema-direita "a níveis nunca vistos na política" portuguesa desde o fim do Estado Novo, dando como exemplo que 15% dos delegados ao último congresso votaram a favor de uma resolução que propunha que fossem retirados os ovários às mulheres que praticassem aborto.
Extrema-direita tirou "vantagem da insatisfação, frustração e ressentimento" das medidas contra a covid-19
A parte portuguesa deste relatório, que retrata a situação em vários países da União Europeia, mas também da Europa de Leste, é da autoria de dois jornalistas que se dedicam ao estudo da extrema-direita, Ricardo Cabral Fernandes e Filipe Teles, que avisam para o risco de a extrema-direita tentar "tirar vantagem da insatisfação, frustração e ressentimento da crise socioeconómica causada pelas medidas para conter a pandemia covid-19".
A exemplo, defendem, do que já começou a acontecer em 2020, ano em que o país viveu a crise devido à pandemia de covid-19, quando o Chega, por exemplo, organizou uma manifestação contra a pedofilia, o que "abriu a porta à mobilização da extrema-direita", organizada por movimentos "pela verdade" de negacionistas.
"Os protestos começaram com algumas dezenas de participantes, mas já conseguem juntar algumas centenas de pessoas", assinala-se no texto. O relatório visa fazer um retrato sobre área e temas que a direita radical e extrema-direita está a explorar e foi encomendado por três organizações não-governamentais, HOPE not hate, (Esperança, não ódio, anti-racista), do Reino Unido, Expo, da Suécia, e Fundação Amadeu António, da Alemanha.
Em Portugal, são identificados seis grupos ligados à extrema-direita. O Chega é identificado como populista radical de direita, o Ergue-te (ex-PNR) de extrema-direita, os grupos Escudo Indentitário e Associação Portugueses Primeiro são considerados identitários, Hammer Skin neo-nazis e o Movimento Zero, movimento não orgânico nas polícias, é definido como populistas de extrema-direita.
Assinala-se ainda a criação de novos grupos como a Resistência Nacional, "responsável por uma concentração em frente à sede do SOS Racismo", em que os manifestantes envergaram máscaras e usaram tochas, e o movimento Defender Portugal.
"A infiltração de extrema-direita nos protestos por melhores condições de vida, como é o caso dos pequenos e médios empresários, deverá continuar. E não se pode, neste caso, com o agravamento da crise social e económica, excluir a possibilidade de radicalização nas formas de protesto da extrema-direita portuguesa", aponta o documento.
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