Hospitais portugueses à beira da rutura com aumento de casos
Hospitais portugueses à beira da rutura com aumento de casos
O número crescente de casos de covid-19 que se têm registado desde o Natal, em Portugal, já está a ter um forte impacto nos hospitais do país, com muitos à beira da rutura ou com a capacidade esgotada para receber esses doentes.
Na quarta-feira à tarde, os hospitais públicos da região de Lisboa e Vale do Tejo receberam orientações do Ministério da Saúde para suspender a atividade não urgente e elevar os seus planos de contingência devido ao agravamento da situação epidemiológica.
A medida foi tomada na sequência da recomendação da Comissão de Acompanhamento da Resposta Nacional em Medicina Intensiva para a Covid-19 (CARNMI) numa reunião de trabalho na terça-feira para “análise da situação epidemiológica regional e da ocupação de camas na Região de LVT”, adiantou o ministério numa resposta à agência Lusa.
“Considerou-se necessário que os hospitais da região escalassem os seus planos de contingência para dar resposta a necessidades de internamento decorrentes de uma procura potencialmente crescente”, sublinha o mesmo documento.
Segundo o Ministério, “o que se pretende é assegurar que, sendo necessário, existe aumento da capacidade de resposta ao doente crítico”.
Évora. Doentes esperam vez nas ambulâncias
A sobrecarga sentida nos hospitais de Lisboa e Vale do Tejo estende-se a outras zonas do país. A sul há estruturas com a capacidade de resposta comprometida e que deixaram de aceitar doentes com suspeita de covid-19, encaminhando-os para outros hospitais.
Foi o caso do Hospital de Évora, que no último domingo emitiu um comunicado a pedir que não fossem encaminhados para os seus serviços de urgência doentes com covid-19 ou suspeitos de infeção pelo coronavírus SARS-CoV-2 , “devido ao extraordinário aumento de afluxo de doentes” na área dedicada aos doentes respiratórios.
Ontem o hospital dava conta de que a procura de tratamento hospitalar de doentes com covid-19 subiu “40%” entre o início e o fim de dezembro e deverá agravar-se.
“O apelo” é para que, “quem está positivo, mas que não necessita de cuidados hospitalares”, permaneça na sua residência, seja domicílio privado, seja lar, “até efetivamente ter sintomas que justifiquem a necessidade de vir à Urgência do hospital”, pediu a presidente do conselho de administração do Hospital do Espírito Santo de Évora (HESE).
O apelo foi feito horas depois de o presidente da Federação dos Bombeiros do Distrito de Évora ter alertado para o facto de as corporações estarem com dificuldades face ao excesso de doentes com covid-19 transportados de lares e à demora na sua admissão no hospital.
“A questão da covid-19 e da Urgência” do HESE “está difícil”, porque a unidade “está cheia, tem dificuldades em receber os doentes”, disse Inácio Esperança à Lusa.
O responsável revelou que, fruto disso, “há várias corporações que têm ambulâncias, com doentes, paradas durante horas” no exterior do hospital.
“Há falhas na Saúde”, que “está a ser muito pressionada”, e “devia-se ter pensado em alternativas e programado as coisas de outra maneira”, porque “este grande afluxo era mais do que previsível”, argumentou o presidente da Federação dos Bombeiros do Distrito de Évora, que apontou também o dedo aos lares.
"O problema também são as estruturas residenciais para idosos (ERPI) e os lares, que despejam as pessoas no hospital”, afirmou.
Na quarta-feira, só a região do Alentejo contava 16 surtos em lares, com 750 infetados.
Pressão hospitalar no Norte e Centro
O Centro Hospitalar Tondela-Viseu ativou o nível máximo do plano de contingência devido ao crescente número de casos de covid-19 e, apesar de ainda estar a responder às necessidades, está “praticamente no limite”.
“Em termos de equipamentos materiais e humanos, os atuais ainda estão a responder às necessidades que temos, embora praticamente no limite”, reconhece, em comunicado enviado à agência Lusa, o Centro Hospitalar Tondela-Viseu (CHTV).
Face ao crescente número de infetados, o CHTV está “a reforçar a capacidade do hospital, mas é fundamental não baixar a guarda” e “em caso de necessidade, há a possibilidade de abrir uma sexta enfermaria” dedicada à covid-19.
Já o Centro Hospitalar de Leiria (CHL) tinha ontem disponíveis apenas sete das 120 camas para tratamento de doentes com covid-19, admitindo suspender a atividade cirúrgica e médica programada e não urgente, para libertar recursos.
Os hospitais do Oeste - Caldas da Rainha e de Torres Vedras - também estão em situação de sobrelotação nos serviços de urgências e nas enfermarias covid-19, onde estão internados 70 doentes infetados,
Menos pressionado, o Centro Hospitalar do Médio Tejo (CHMT) revelou que tem 103 doentes internados devido à infeção causada pelo vírus SARS-CoV-2, 94 dos quais em enfermaria e nove em cuidados intensivos e que tem ainda disponibilidade para acolher doentes de outros pontos do país.
Em resposta à Lusa, o CHMT, que dispõe de três unidades hospitalares (em Torres Novas, Tomar e Abrantes), no norte do distrito de Santarém, afirmou que ainda não atingiu a capacidade atual de 121 camas, sendo que pode vir a acolher até 197 doentes covid-19.
Ontem, o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses alertava que o Hospital dos Covões, em Coimbra, estava "em rutura e sem condições de trabalho e segurança", havendo cerca de 30 doentes com covid-19 "a necessitarem de ser internados sem que para tal haja lugar".
Nos hospitais do Norte, ocupação de camas dedicadas à covid-19, em cuidados intensivos, era, na segunda-feira, de 78,3%, de acordo com dados da Administração Regional de Saúde do Norte (ARS-Norte).
Estavam internados nos cuidados intensivos na região Norte 213 doentes covid, sendo que 137 estavam ventilados.
Segundo os dados da ARS-Norte, existem 1.175 camas dedicadas a doentes covid-19 nos hospitais da região. Na segunda-feira estavam internados 852 doentes em enfermaria, o que corresponde a uma taxa de 72,5 %.
Na região Norte existem 16 equipamentos de saúde: nove centros hospitalares, quatro hospitais e três unidades de saúde local.
O "preço" do alívio no Natal, mas com risco calculado
O aumento de casos de covid-19 se tem registado nestes últimos dias deve-se ao alívio das restrições no país durante a época do Natal, sendo previsível que os números se mantenham altos por mais algum tempo.
“Estamos a pagar o preço de ter aliviado um bocadinho as medidas de contenção quando foi o Natal e o Ano Novo. Foi um risco calculado e não se pode dizer que fosse surpresa para quem está por dentro destas coisas”, afirmou à Lusa o infeciologista Jaime Nina.
Segundo o médico, que é infeciologista do Hospital Egas Moniz, em Lisboa, só vai começar a verificar-se uma diminuição significativa do número de infeções por covid-19 “quando se começar a sentir o impacto da vacinação, particularmente, nos idosos e nos lares”, o que só deverá acontecer no "fim de março ou início de abril". Nessa altura, "se não tivermos passado para metade o número de mortos que temos neste momento, fico muito admirado”, referiu.
Jaime Nina adiantou ainda que “faz confusão” que o Governo “continue só a insistir na máscara, no confinamento e, até certo ponto, no distanciamento social” e que só estejam a ser feitos rastreios de uma “minoria de casos” em Portugal.
Forças armadas apoiam SNS
Atualmente, estão a ser tratados pelas Forças Armadas 47 doentes, 29 no polo do Porto e 18 no polo de Lisboa.
Em comunicado, enviado à Lusa, as Forças Armadas, “disponibilizaram ao SNS 78 camas de internamento no HFAR-Polo do Porto e 20 camas de internamento, além de duas camas de cuidados intensivos no polo de Lisboa".
Desde o início da crise pandémica, em março, o Hospital das Forças Armadas tratou 506 doentes de covid-19 transferidos do SNS.
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