Associação luxemburguesa prolonga vida de telemóveis e computadores
Associação luxemburguesa prolonga vida de telemóveis e computadores
Patrick de la Hamette lembra-se vivamente do ano de 2015, em que muitos refugiados, especialmente da Síria, Iraque ou Afeganistão chegaram ao Luxemburgo através da chamada rota dos Balcãs.
Na altura, o engenheiro eletrotécnico visitou um centro de refugiados e percebeu que era preciso fazer alguma coisa para preencher as suas carências digitais. "Não havia Wi-Fi e computadores, mas a maior parte tinha smartphones", recorda, acrescentando que "muitos sofriam com a longa espera pelos procedimentos de acolhimento e não tinham nada que fazer".
Sem computadores, estas pessoas estavam, até certo ponto, excluídas da sociedade, por isso Patrick de la Hamette decidiu lançar a associação Digital Inclusion em 2016.
Muita coisa aconteceu desde aí. A oferta do projeto aumentou continuamente nos últimos anos. A associação passou a receber financiamento do Ministério da Família. O objetivo é tornar a participação digital possível para toda a gente. Patrick de la Hamette explica: "Ajudamos pessoas que não conseguem aceder ao mundo digital sem apoio. Vemo-nos como uma startup social inovadora que combina questões de escassez de recursos, migrações e inclusão digital."
Trabalho desenvolvido com parceiros sociais
Este problema ganhou nova relevância com a covid-19. "A pandemia tornou o mundo digital mainstream", argumenta o responsável, referindo a prevalência do teletrabalho. Contudo, a associação não apoia apenas novatos do digital, mas também pessoas que ficam temporariamente sem acesso a um smartphone, ora porque o perderam, ora porque se avariou.
Para distribuir os telemóveis, a associação trabalha com parceiros sociais como a Caritas, a Cruz Vermelha, o Gabinete Nacional de Acolhimento (ONA, na sigla em francês) e os serviços sociais, que decidem quem se encontra numa situação de urgência e precisa de acesso a um smartphone no imediato. A Digital Inclusion apenas providencia os equipamentos e distribui vales para o efeito aos parceiros sociais.
A situação é diferente relativamente aos computadores. Nesse caso, as pessoas elegíveis para este apoio têm de receber o subsídio de custo de vida ou ter estatuto de refugiado. Se cumprir um destes requisitos, o período de espera para ter um computador é de um a dois meses e, para telemóveis, é de uma a duas semanas.
Entregar o telemóvel antigo num envelope
Em 2018, a Digital Inclusion lançou o projeto Mobile-Bag, na altura com apoio da Caritas e do Post. Entretanto, a Solina Aarbechtshëllef assumiu o lugar da Caritas. A particularidade da iniciativa é a sua simplicidade: qualquer pessoa que tenha um telemóvel de que já não precise pode colocá-lo numa Mobile-Bag e entregá-lo em qualquer posto dos correios. Os carteiros também aceitam o envelope de cartão.
Uma nova edição do Mobile-Bag foi lançada no final do ano passado. Os envelopes receberam um novo design e foram distribuídos em escolas, comunas e empresas.
A maioria das pessoas não utilizam os smartphones durante toda a sua vida útil
Patrick de la Hamette
A Mobile-Bag permite às pessoas tornar o seu smartphone mais amigo do ambiente, como clarifica o presidente da associação: "As pessoas melhoram a sua pegada de carbono e não usam mais recursos do que o necessário. A maioria não utiliza os smartphones durante toda a sua vida útil. O nosso modelo permite mudar isso."
Por exemplo, quem não quiser abdicar de comprar o smartphone que acaba de sair pode entregar o antigo, que irá continuar a ser usado. Patrick de la Hamette admite que faz parte deste grupo, uma vez que troca de telemóvel a cada dois ou três anos.
Refugiados ajudam a reparar equipamentos
O projeto tem uma outra vertente social, pois ajuda a criar postos de trabalho para integrá-las no mercado de trabalho. Por exemplo, há refugiados da Síria, Ucrânia e Eritreia a trabalhar nos equipamentos.
Um deles é Hassan Almohammed, sírio que já arranjava telemóveis antes de deixar o seu país. Agora, é responsável pela reparação de smartphones que satisfazem os critérios para desfrutar de uma segunda vida. Também decide quais os aparelhos que serão desmantelados para ser enviados para a Solina Aarbechtshëllef e reciclados manualmente. Geralmente, todas as gerações a partir do iPhone 7 ainda podem ser atualizadas e são, portanto, totalmente funcionais. Um smartphone tem uma vida útil de cerca de seis anos.
Grande parte dos dispositivos vêm de grandes empresas
Patrick de la Hamette
A Digital Inclusion consegue reparar danos significativos como os vidros partidos nos ecrãs dos smartphones. Mas muitos dos equipamentos que vêm de bancos, por exemplo, não têm grandes estragos e são fáceis de arranjar. "Grande parte dos dispositivos vêm de grandes empresas", refere o responsável. Muitas vezes, a associação recebe teclados novos, ainda na sua embalagem original, que de outra forma acabariam no lixo.
Disponibilizadas aulas em oito línguas
No ano passado, a Digital Inclusion começou a disponibilizar aulas para pessoas que nunca tiveram contacto com um computador ou um telemóvel. Durante duas horas, os participantes aprendem o básico sobre a utilização de um smartphone. O objetivo é ensiná-los a mexer no seu telemóvel sozinhos, sem intervenção direta dos professores. As aulas são dadas em oito línguas: árabe, inglês, francês, luxemburguês, persa, português, espanhol e tigré.
A guerra na Ucrânia e os movimentos de refugiados relacionados deixaram a associação assoberbada nos últimos meses. "Claro que a nossa ambição era ajudar também os ucranianos. Conseguimos fazê-lo, mas não teria sido possível sem muitos voluntários", reconhece Patrick de la Hamette.
O aumento significativo de pedidos de ajuda reflete-se nos números da associação. Se, em 2021, a Digital Inclusion distribuiu 736 computadores e 241 smartphones, no ano passado distribuiu 2.010 computadores e 271 smartphones. Desde 2016, a associação já reparou mais de 5.700 computadores.
(Artigo originalmente publicado no Luxemburger Wort e adaptado para o Contacto por Maria Monteiro.)
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