Apps de rastreio à covid-19. Comité de Ética deixa recomendações
Apps de rastreio à covid-19. Comité de Ética deixa recomendações
Com o desconfinamento, a proximidade das férias e a reabertura das fronteiras europeias num horizonte próximo, as apps de rastreio para a covid-19 voltam a estar em debate.
Se sobre a utilidade da uma aplicação deste género na prevenção sanitária e conhecimento das cadeias de contágio parece não haver dúvidas, o mesmo não se pode dizer sobre as questões de privacidade que levanta.
A ideia de uma aplicação para telemóvel que possa rastrear contactos e localização com o objetivo de detetar potenciais infetados com covid-19 não convenceu o primeiro-ministro luxemburguês, Xavier Bettel, que em abril afirmou discordar da introdução no país dessa solução. "Não gosto dessa ideia", disse na altura. No mesmo mês, a Comissão Europeia lembrou que a utilização dos dados de localização em aplicações móveis "viola" as regras comunitárias e a privacidade dos cidadãos, mas não fechou a porta ao desenvolvimento de aplicações que possam ser úteis nesta crise de saúde e deixou orientações.
Em linha com estas, o Comité de Ética do Luxemburgo aconselhou o governo a elaborar uma análise detalhada sobre os motivos técnicos e judiciais subjacentes a este método de rastreio e deixou várias recomendações. Entre elas, a adesão a esse tipo de aplicações deve ser voluntária e não imposta.
Funcionalidades como a geolocalização devem ser opcionais, transparentes, minimalistas e limitadas a um determinado período de tempo, defende o organismo, citado pela RTL, na passada segunda-feira. Além disso, os objectivos e métodos da aplicação devem ser claros e comunicados aos seus utilizadores.
Outra das recomendações do organismo é que os utilizadores possam apagar as suas informações pessoais a qualquer momento e desativar a aplicação se assim o desejarem. Para haver uma prorrogação do período de rastreio, através a aplicação móvel, esta deverá exigir a autorização prévia do utilizador, acrescenta o Comité de Ética.
Segundo este organismo, os dados pessoais podem ser guardados numa central de armazenamento de dados, mas a informação deve ser estritamente limitada para garantir que um utilizador não possa ser identificado.
Ao Contacto, Alexandra Aragão, investigadora da Universidade de Coimbra, lembra que o que a recomendação da Comissão Europeia sugere, em termos de garantia dos dados pessoais, é que os dados não sejam transmitidos para lado nenhum. "Não há nenhuma base centralizada de dados. Os dados relativos aos trajetos das pessoas são armazenados no seu próprio telemóvel e aquilo a que o telemóvel tem acesso é ao identificador individual (IMEI) dos outros telemóveis junto de quem a pessoa esteve. Mas para utilização destas apps não deverá haver um registo, não se terá que introduzir um nome, um email ou uma password. A identificação é feita apenas pelo IMEI do telemóvel", exemplifica a jurista que tem analisado os prós e os contras destas aplicações.
Portugal prepara-se para utilizar a ‘app’ STAYAWAY COVID para monitorizar a propagação do novo coronavírus. A aplicação está a ser desenvolvida pelo Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência e o governo, que através do primeiro-ministro, António Costa, garantiu que a adesão será voluntária, está a acompanhar o trabalho. Porém, subsistem dúvidas entre os especialistas quanto à garantia de privacidade e acesso a dados, que indiquem, por exemplo, com quem e quantas pessaos alguém esteve, a que horas e onde, se se adicionar a funcionalidade de geolocalização.
No final de maio foi divulgada uma declaração conjunta dos responsáveis das pastas de digitalização de Portugal, Alemanha, Espanha, França e Itália, que defende essas aplicações digitais e onde os cinco estados se comprometem "com um esforço conjunto para atingir o nível exigido de interoperabilidade transfronteiriça".
O Comité de Ética do Luxemburgo recomenda que o intercâmbio de dados seja limitado aos Estados-Membros da União Europeia. É igualmente sugerida a formação, no Grão-Ducado, de um comité externo, que inclua especialistas no domínio das TI, da saúde, da privacidade dos dados e da ética.
Numa análise mais abrangente, a investigadora Alexandra Aragão defende que seria mesmo "conveniente criar legislação específica em termos de proteção dos utentes, consumidores, pacientes e para maior conforto também das entidades de saúde que tenham acesso a esses dados. Seria bom haver um enquadramento jurídico mais aprofundado."
De acordo com a edição francesa do Luxemburger Wort, esta terça-feira, 9 de junho, em debate na Câmara dos Deputados, Xavier Bettel admitiu poder rever a posição do governo sobre as apps de rastreio, ainda que mantenha o ceticismo. Questionado pelo CSV sobre qual a reação do governo face às orientações do Comité de Ética para a sua utilização, o primeiro-ministro disse ter "a impressão de estar num mau filme", referindo-se ao facto de "há apenas um mês, o Parlamento ter votado, com os votos de todos os partidos exceto o ADR, uma moção apelando ao governo para que utilize o rastreio analógico durante o maior tempo possível". "Mas agora exige-se o contrário", declarou, na discussão de ontem, admitindo estar disposto a mudar de posição face a essas aplicações, na condição "de que o Parlamento saiba o que quer".
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