Preços de energia caem, mas faturas dos consumidores continuam altas
Preços de energia caem, mas faturas dos consumidores continuam altas
Os preços no mercado do gás estão a descer desde dezembro de 2022, mas as contas de gás e eletricidade continuam altas e a dificultar a vida, cada vez mais cara, os consumidores.
O TTF [Title Transfer Facility] holandês, considerado a referência europeia para o gás natural, já caiu cerca de 18% em 2023. E desde a última subida, em agosto, causada por uma interrupção no fornecimento do gás, por parte da Rússia, o preço do gás natural na Europa caiu mais de 82%.
Atualmente, o gás está a ser negociado nos mesmos níveis de setembro de 2021, cerca de 60 euros por megawatt-hora (MWh), o que, ainda assim, representa mais que o dobro do preço a que era vendido antes da pandemia de covid-19.
A guerra na Ucrânia pôs em evidência a dependência da Europa do gás russo, da qual o velho continente tem tentado ao máximo libertar-se, entre reuniões de urgência e recorrendo a apelos de limitação do consumo desta fonte de energia.
Esta mudança de estratégia dos países europeus, aliada às temperaturas excecionalmente amenas deste inverno permitiram às nações europeias garantir stocks de armazenamento que ainda não usaram.
"Os stocks de gás na Europa tem estado a cerca de 82% da capacidade total, nas últimas semanas, contrastando com os 50% do ano anterior e acima da média sazonal de cinco anos correspondente a 70%", explica John Plassard, do grupo financeiro Mirabaud.
Europa a caminho da retoma?
Os discursos tranquilizadores por parte dos governantes e de entidades europeias também se têm vindo a multiplicar. "Os preços estão a cair na Europa", depois dos aumentos dos últimos meses, disse o chanceler alemão Olaf Scholz no passado sábado, saudando as "decisões" tomadas para acabar com a dependência do gás russo.
Esta quinta-feira, o BCE também reviu as perspetivas económicas para a zona euro, sinalizando uma melhoria.
Segundo a presidente da instituição europeia, Christine Lagarde, a atividade da zona euro abrandou face a 2022, mas será "bem melhor" este ano do que inicialmente se previa, apesar da inflação e da crise energética.
"As notícias tornaram-se muito mais positivas nas últimas semanas", fazendo prever que o ano em curso "não será brilhante, mas muito melhor do que o temido", disse Lagarde no Fórum Económico de Davos, citada pela Lusa.
A responsável destacou o dinamismo do mercado de trabalho na Europa, com o número de desempregados "no nível mais baixo dos últimos 20 anos", referindo-se em particular à Alemanha, a maior economia europeia, que deverá escapar à recessão em 2023, apesar da situação ainda tensa face à crise energética.
O país, que foi duramente atingido pela inflação, com aumentos nos custos de produção da indústria - considerado o motor da sua economia -, está a dar sinais de robustez maiores do que o esperado, graças à manutenção da capacidade de consumo e às ajudas públicas.
Christine Lagarde lembrou que os dados sobre a inflação permanecem "demasiado elevados", embora os aumentos de preços tenham abrandado depois de atingirem um pico superior a 10% em outubro.
"A nossa determinação no banco central é trazer (a inflação de volta ao) objetivo de 2% de forma atempada" tomando "todas as medidas para o conseguir", disse a presidente do BCE, que aumentou as taxas de juro em 2,5 pontos percentuais desde julho.
Já a Comissão Europeia prevê uma contração do Produto Interno Bruto (PIB) tanto para a zona euro como para a UE no último trimestre de 2022 e nos primeiros três meses de 2023, antes de uma recuperação no resto do ano.
Contas da luz e do gás deverão continuar altas
Apesar das perspetivas de retoma económica e da descida dos preços na energia, nas faturas dos consumidores, os valores do gás e da eletricidade permanecem elevados e parecem estar para durar.
Anders Opedal, chefe executivo do gigante norueguês da energia Equinor, deixou, na segunda-feira, um alerta, em declarações à BBC, dizendo que os consumidores não devem esperar que os preços voltem aos níveis anteriores à invasão russa da Ucrânia.
"Poderá levar anos até que os preços regressem aos níveis com que os consumidores europeus se sentem mais confortáveis", acrescentou Edward Moya, analista da Oanda, à AFP.
"Impostos", "aumento dos custos de transporte" ou "escassez de mão-de-obra", são muitos os custos adicionais entre o gás adquirido pelas empresas de energia e a fatura final que chega ao consumidor.
E quando as empresas de energia compram gás ou eletricidade nos mercados, raramente pagam o preço à vista, mas "compram com base em contratos a longo prazo", disse Biraj Borkhataria, analista da RBC Capital Markets, à AFP. Estes contratos a prazo fornecem segurança, pois garantem um determinado preço durante um determinado período de tempo, protegendo assim o comprador da volatilidade dos preços, que é muito frequente no mercado do gás.
Ole Hvalbye, um analista da Seb, também aponta o dedo à França, um grande consumidor de eletricidade na UE, cuja produção por via da energia nuclear é atualmente 25% inferior ao normal para esta época do ano. No entanto, o país recebe 70% da sua eletricidade através da energia nuclear.
A França "continua a absorver uma grande parte da produção excedentária de eletricidade na UE, pelo que os preços da eletricidade permanecem elevados", afirmou.
Transição energética também passa pelas faturas dos consumidores
As empresas energéticas estão também "a enfrentar um aumento das despesas com a transição dos combustíveis fósseis para fontes de energia alternativas", continuou Edward Moya. Um argumento apoiado por Anders Opedal, que na sua entrevista à BBC destacou o atual "redesenho" de todo o sistema energético na Europa, acelerado pelo declínio no fornecimento de gás russo, assente na necessidade de investir fortemente em energias renováveis.
"Vai exigir muito investimento que tem de ser pago, por isso suponho que as contas de energia possam ser ligeiramente mais altas do que no passado", sublinhou.
Esta quinta-feira, em Davos, a presidente do BCE também apontou a necessidade de fazer progressos na transição digital e verde, cujas necessidades de financiamento serão muito importantes e para as quais o dinheiro público "não será suficiente".
Lagarde apelou a que sejam feitios progressos rápidos no sentido da união dos mercados de capitais.
"Temos de avançar para esta dupla transição e as necessidades de financiamento serão muito grandes para avançarmos rapidamente e para nos tornarmos mais independentes e menos vulneráveis", disse.
(Com AFP e Lusa)
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