Santos de casa também fazem milagres
Santos de casa também fazem milagres
Fernando Manuel Fernandes da Costa Santos, eis o nome completo do homem, o primeiro de sempre a chegar aos 100 jogos como seleccionador de Portugal. Apresentado como substituto de Paulo Bento em Setembro 2014, a vida de Fernando Santos, já de si cheia com a passagem pelos três grandes (FC Porto, Sporting e Benfica por ordem cronológica) e ainda a selecção grega no Euro-2012 mais Mundial-2014, dá uma volta interessante e chega esta quinta-feira à centena de jogos.
O adversário é a Chéquia, para a terceira jornada da fase de grupos da Liga das Nações, no José Alvalade, onde Portugal continua sem sofrer golos na primeira parte desde a estreia, em 2004. Daí para cá, 13 jogos. Incrível. Mais incrível é o número de Fernando Santos. Repetimo-nos, 100 jogos. É obra. Com um total de 61 vitórias, 23 empates e 15 derrotas. É obra de mestre, acrescentamos. Golos marcados, 204. O maior é Ronaldo, 67 – o segundo classificado deste ranking só tem 19 e é André Silva. O balanço é positivo, seja em estatística e resultados, com os dois títulos (Euro-2016, Liga das Nações-2019) e a inédita presença na Taça das Confederações (2017).
Este texto trata de falar das vitórias vs campeões mundiais, um acontecimento raro na vida de qualquer selecção e também glorioso para qualquer seleccionador. Fernando Santos acumula três, vs Argentina, Itália e França, nenhum deles em casa (amaziiiing). A epopeia começa em Novembro 2014, dia 18, uma terça-feira, em campo neutro (Old Trafford). Com Beto à baliza, Portugal nunca perde.
Pela décima vez, a tradição mantém-se. Com muita felicidade à mistura, é verdade. Tanto porque a Argentina ameaça muuuuito mais vezes a baliza portuguesa sem ser devidamente recompensada e também porque o golo do suplente Raphaël Guerreiro cai do céu, aos 90’+2. Literalmente. Senão, veja lá bem: remate de Adrien à entrada da área contra o corpo de Éder e a bola perde-se pela direita, onde Quaresma saca um cruzamento perfeito para o cabeceamento do número 13, o tal que já marcara em Old Trafford por ocasião de um Portugal-Bulgária no Mundial-66 (Eusébio).
Antes, tudo é triste. Quer dizer, com Ronaldo e Messi em campo, a magia funciona aqui e ali. Mal a dupla sai de cena, ao intervalo, o jogo entra num ritmo exasperante, um hino ao bocejo ilimitado. Aquilo nem anima com as entradas de Jonathan (Sporting) e Gaitán (Benfica). Vale a magra vitória sobre a Argentina, a segunda de sempre em oito jogos e a primeira desde 1972, em dia de três estreias (Tiago Gomes, José Fonte e Adrien).
Sete meses depois, em Junho 2015, dia 16, outra terça-feira, outro campo neutro, agora Genebra, 1:0 vs Itália. Lembra-se onde estava a 22 Fevereiro 1976? Se a resposta é José Alvalade, é um sortudo por ter assistido ao bis de Nené à Itália. Daí para cá, no confronto directo, 11 jogos e zero vitórias em 39 anos de bola. Mais, dessas zero vitórias, só um empate (0:0 em 1992 nos EUA para a US Cup). O balanço é confrangedor. Para fechar a época desportiva 2014-15, Portugal e Itália combinam um particular na Suíça.
À falta dos protagonistas (sem Buffon nem Ronaldo, ambos capitães), sobra a emoção. Para já, há um jogador do Marítimo no 11 (Danilo), algo que não acontece há 20 anos, com a dupla Vado-Paulo Alves. Depois há o espectáculo Éder. Ao 18.º jogo na selecção, o avançado do Braga marca finalmente o primeiro golo. E que golo. Eliseu, que substituíra Coentrão por lesão aos 24 minutos, vai por ali fora e ultrapassa dois italianos antes de lateralizar para Quaresma, cuja trivela bem calibrada apanha Éder na cara de Sirigu. O pontapé é fulminante, por alto. Eis o segundo golo do Braga na selecção, após o de Dito à RFA em 1983. Éder, fixe bem este nome.
Pois é, fixe-o. É dele o golo solitário na final do Euro-2016, a 10 Julho, um domingo, no Stade de France. No outro lado do relvado, a favorita França. Favorita por estatuto, história, estatística e até jogo jogado nesse Euro (acabara de eliminar a Alemanha por tranquilo 2:0). Portugal enche-se de brio e dá a volta aos acontecimentos com pompa e circunstância. Que noite, que magia, que encanto. Portugal é campeão da Europa, graças a um golo de Éder, numa noite em que o capitão Ronaldo é substituído aos 28 minutos, por falta imprevidente de Payet.
A França carrega très bien e até poderia ter evitado o prolongamento, não fosse Patrício com quatro defesas do outro mundo e ainda o poste, num remate de Gignac em cima dos 90’. De suplente para suplente, Éder tem a palavra. Um minuto depois de Guerreiro acertar uma bola na trave, de livre directo, o número 9 português domina, afasta Koscielny e atira com o pé direito, bem de longe. Lloris reage tarde, Portugal celebra até às tantas.
Que noite, que magia, que encanto. Islândia, Áustria, Hungria, Croácia, Polónia, Gales e França. Nenhuma derrota em sete jogos, três deles com prolongamento e um dos quais resolvido nos penáltis. Eis o meritório percurso da selecção portuguesa, rumo ao inédito título de campeão europeu. Patrício acaba o Europeu sem sofrer qualquer golo nos últimos 328 minutos. À sua frente, o quarteto só se define a partir dos oitavos-de-final com Cédric e Raphaël nas alas mais Fonte e Pepe no meio. À sua frente, William bem ajudado por Adrien, João Mário e Renato. No ataque, Ronaldo defende mais que nunca e Nani faz de 9. Os suplentes Quaresma e Éder saltam do banco para evitar os penáltis vs Croácia e França. Somos campeões, vamos à Taça das Confederações-2017. A Europa é nossa.
(Autor escreve de acordo com a antiga ortografia.)
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