O luxemburguês que pinta Lisboa nas asas do corvo
O luxemburguês que pinta Lisboa nas asas do corvo
O sr. José, 88 anos, e a D. Maria, sua esposa com 78 primaveras, vão ter saudades do jovem luxemburguês a quem durante seis dias deram os bons dias da sua janela, enquanto criava um mural artístico junto ao seu prédio, na Rua da Bombarda, a dois passos do Martim Moniz, em Lisboa.
Alain Welter, artista urbano e ilustrador, famoso no Luxemburgo, regressou a casa, mas a sua obra, o primeiro mural de um luxemburguês em Lisboa, ficará exposta em permanência, impresso no cimento outrora triste nesta esquina lisboeta.
“Está muito bonito e é um prazer ver esta obra nascer e ficar pronta, temos de dar os parabéns ao artista. Até vou buscar o meu chapéu parecido com o do Fernando Pessoa como o que ele pintou”, diz a rir o Sr. José (na foto à janela). “Agora o largo tem outra graça com esta pintura”, acrescentava a esposa, D. Maria, elevando o rosto para ver o artista trabalhar. O casal depressa percebeu que a obra de Alain Welter é composta por símbolos da cidade de Lisboa.
Um corvo gigante azul enche a parede. Sob a sua cabeça paira o famoso chapéu do poeta Fernando Pessoa, e, mais ao lado, voa um pastel de nata, enquanto uma corda marítima o envolve livremente. Para Alain Welter, de 28 anos, esta sua primeira obra na capital portuguesa tinha de ter símbolos da cidade, como explicou após descer da grua, onde empoleirado dava os últimos retoques no seu fresco.
Ao mesmo tempo que o luxemburguês criava a sua obra em Lisboa, a artista urbana portuguesa Mariana Duarte Santos pintava um mural em Esch-Lallange. O facto de o corvo ser símbolo maior de Lisboa, presente no brasão de armas da cidade, encheu-o de satisfação.
Corvo também símbolo de Kahler
“O corvo é também o símbolo da minha terra natal, Kahler, no Luxemburgo, onde já tinha pintado um mural com três corvos. Só que o edifício foi demolido. Agora pude voltar a pintar esta ave e é como se a obra renascesse de novo, o que me deixa muito contente”, explica o artista. A cor azul do corvo foi buscá-la ao mar e também aos “azulejos portugueses que admiro imenso”.
O pastel de nata dispensa explicações. Uma doçaria que Alain Welter muito aprecia e conhece, pois não é difícil encontrá-la no Grão-Ducado. A rir, confidencia que inicialmente tinha previsto pintar uma cerveja, mas “não era politicamente correto por ser bebida alcoólica e, por isso, escolhi o pastel de nata, de que gosto muito”.
Os seis dias foram passados de pincel na mão, das 9h00 da manhã às 9h00 da noite. “Sou um pouco workaholic por isso tenho passado aqui os dias a pintar, mas não faz mal. Basta-me dois dias livres para poder passear em Lisboa”, declara.
De bicicleta pela cidade
Para poder aproveitar melhor a cidade, o luxemburguês deslocava-se numa bicicleta urbana e diariamente passava pelo Terreiro do Paço, junto ao Cais das Colunas, de onde em séculos idos partiram as naus à descoberta de novos mundos. A corda marítima retratada na sua obra representa isso mesmo: “A ligação de Lisboa ao mar e às descobertas, mas também um elo de ligação aos dois países, Portugal e Luxemburgo”.
Esta é a terceira visita a Portugal, a primeira em trabalho, mas deseja muito voltar a Lisboa para continuar a colorir a cidade com a sua arte. O resultado do mural deixa-o “muito feliz”, ainda mais pelo “feedback dos moradores da praceta, que foi muito positivo. Dizem gostar muito e são todos simpáticos”, realça, acrescentando que “adora Lisboa, a hospitalidade portuguesa, a paleta de cores da cidade, com a sua luz e os azulejos, e a gastronomia”. À noite, aproveitava para rever amigos, portugueses e luxemburgueses, e conhecer melhor esta capital.
Famoso no Luxemburgo
No Luxemburgo, Alain Weber tem diversas obras famosas espalhadas pelo país, como os murais "Make Koler Kooler", na sua cidade natal, a intervenção artística nas colunas da fábrica Arcelor Mittal, em Differdange, e agora a ilustração de 10 autocarros e da coleção da cerveja Bofferding, alusivos a Esch2022. Pela Alemanha, Bélgica e Cabo Verde também já tem a sua assinatura em murais.
Esta “ótima experiência” portuguesa de Alain Welter resulta de uma colaboração entre a Kulturfabrik, em Esch, a Galeria de Arte Urbana da Câmara Municipal de Lisboa e a Embaixada do Luxemburgo em Portugal, com o apoio da Esch2022 e do Post Luxembourg.
Depois de Lisboa, Alain Welter vai continuar a imprimir a sua arte urbana além- fronteiras, regressando à Bélgica e depois estreando-se em Inglaterra, realizando o desejo de ir mais longe e mostrar a sua obra internacionalmente. “Estou muito feliz e ansioso pelo que o futuro me reserva. Mas, em breve, quero voltar a Lisboa”, remata sorridente.
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