CinÉast: O cinema de leste não existe
CinÉast: O cinema de leste não existe
As nossas dificuldades em nos relacionarmos com as culturas da Europa oriental têm muitas razões mas a barreira linguística não deixa de ser relevante.
Tome-se como exemplo o nome do sindicalista Lech Wałęsa. Com o Lech ninguém se despista (apesar de o "ch" lido correctamente ser um som inexistente em português), mas com o apelido do líder do sindicato Solidariedade (que em polaco se escreve Solidarność) tudo se complica. Para começar temos a letra "ł" que se lê "u" e que só existe na língua polaca. O "ę" que se lhe segue pronuncia-se "en". Sabendo que o "w" se lê como "v" e o "s" como dois "esses" em português, a chave para ler Wałęsa está descoberta: Vauenssa.
Agora já percebe porque é que quando falou com aquele seu amigo polaco sobre o antigo guarda-redes do Futebol Clube do Porto, o Mlinarzik, ele não percebeu de quem estava a falar porque ele conhece o Młynarczyk, ou seja, "Muênarchêk". Mas deixemos o futebol porque o que nos ocupa aqui é o cinema.
O CinÉast de 2013 estende-se de 9 a 27 de Outubro, e projecta 50 longas metragens e outras tantas curtas o que torna impossível listar filmes ou mesmo comentá-los. A mensagem a reter é que a escolha é imensa.
O cinema da Europa central e de leste não existe. Para nós a Europa para lá do muro de Berlim era tudo leste. A União Europeia, na sua habitual originalidade, criou o conceito de Europa Central e de Leste para agradar a muitos (todos) aqueles países para lá de Berlim ou da linha Oder-Neisse que se consideram Europa centralíssima. O leste não sobra para ninguém quando se fala com um checo, um húngaro ou mesmo um búlgaro. De leste são os outros. Mas deixemos a geopolítica porque o que nos ocupa aqui é o cinema.
O cinema da Europa Central e de Leste são muitos cinemas. Se aquilo que se produz na República Checa se pode comparar às tendências da Eslováquia, já pegar na sétima arte romena e compará-la com os mais recentes trabalhos estónios é um exercício tão desnecessário e estúpido como comparar dois vizinhos geográficos mas tão distintos do ponto de vista cinematográfico: Portugal e Espanha
Este é o grande problema do CinÉast: como referência comum só lhe sobra a geografia.
Isto não quer dizer que se deva ser mal agradecido. Este festival é uma oportunidade única de ver nas salas do Grão-Ducado películas que nunca mais – mas mesmo nunca mais – vão conhecer o conforto de um cinema luxemburguês.
Se quiser ajuda para escolher, comece por atacar o “biopic” de Wałęsa que será projectado esta quinta-feira. O filme (na fotografia) tem a chancela de um dos maiores nomes da realização polaca, Andrzej Wajda e conta com os melhores atores daquele país.
Em caso de preguiça pode sempre deixar-se guiar pelos filmes em competição, reduzindo assim a escolha de 50 longas metragens a apenas oito. Os filmes em concurso são:
Os filmes em concurso são:
- "Child's Pose" de Calin Peter Netzer
- "Circles" de Srdan Golubovic
- "Imagine" de Andrzej Jakimowski
- "My Dog Killer" de Mira Fornay
- "A Stranger" de Bobo Jelcic
- "Heavenly Shift" de Márk Bodzsár
- "The Gambler" de Ignas Jonynas
- "The Arbiter" de Kadri Kôusaar
O festival CinÉast é projectado nas seguintes salas entre 9 e 27 de Outubro: Cinemateca, Ancien Cinéma, Utopolis, Kinosch, Kursaal, Abadia de Neumünster, Utopia, Ariston, Waasserhaus e Ariel (Metz).
Raúl Reis
